Page 37 - Escravo Bernardino | Premium | Infinda
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deveria saber para onde. Não conhecia a região e não sabia
           aonde ir. Depois, fugir de quê? Como poderia fugir da
           minha cor? Ser negro era ser escravo, nesta fazenda ou em
           outra, ou na cidade. Mas a vontade de chegar até Mara e
           as crianças me dava forças e continuava a andar, a correr.
              Passei a noite debaixo de uma árvore. Logo pela ma-
           nhã vi um riachozinho que estava num local mais aberto.
           Olhei por todos os lados, não vi ninguém, resolvi tomar
           água. Saí da mata e caminhei até o riacho. Abaixei-me
           para tomá-la e tomei com gosto. Quando levantei a cabe-
           ça, estava cercado por um bando de brancos. Reconheci,
           entre eles, dois feitores da fazenda, os outros eram capi-
           tães do mato, pessoas que trabalhavam só na captura dos
           escravos que fugiam. Esperavam-me ali, talvez já acostu-
                                                                                 34
           mados em prender os fujões ao beber água, pois era ali o              —
           único local a ter água na mata.                                       35
             — Achamos fácil este imbecil!
             — Negro fujão! Levará um bom castigo! – comentaram
           rindo.
              Amarraram-me pelo pescoço com corda, que era pior
           que corrente, e me fizeram andar. Caí muitas vezes, eles
           riam, gozando e me ameaçando com terrível castigo. Pen-
           sava amargurado: “Que castigo teria ainda? Humilhado,
           amarrado, obrigado a andar com dificuldade, fatigado e
           envergonhado por ter sido apanhado facilmente e ter des-
           feitos meus sonhos de reencontrar os meus. Já não era
           castigo o bastante?”
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