Page 42 - Escravo Bernardino | Premium | Infinda
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— Você está vendo como quase morreu? Primeiro os
capatazes costumam matar os fujões e trazê-los mortos,
e a você não fizeram isso. Não morreu com o castigo, o
sinhô não mandou matá-lo e eu pude ajudá-lo. Viu como
escapou da morte? Ela não o quis desta vez e deve ter
seus motivos. Não precisa me agradecer, ajudo sempre
com gosto. Gosto de ser útil. Mas foi Deus-Pai quem nos
ajudou. Você teve muita febre, mas o pior já passou, logo
ficará bom. Sou eu quem cuida de todos os doentes por
aqui, até os da casa-grande. Não tenho outro trabalho, o
sinhô permitiu que só ficasse cuidando dos enfermos.
— Quem lhe ensinou? – indaguei interessado.
— Aprendi. Nesta vida, como Tião, recordei fácil com
umas lições do meu avô. Aprendi em outra vida, mas não
dei valor. Nessa, sim, faço o que me compete com gosto.
— Não tem medo de pegar minha doença, a peste…
— Você não teve peste, você está só doente de fraqueza
e saudades. Não vai sua doença pegar em ninguém. Você
é forte, vai sarar logo. Depois, meu filho, não tenho medo
de doenças nem da morte. A morte me libertará deste
corpo velho e cansado; a doença não pega em ninguém
que não esteja propício a tê-la, entendeu?
Neguei com a cabeça e Tião continuou a me elucidar.
— Filho, a doença só vem se acha o doente, isto é, a
pessoa com predisposição para tê-la ou o espírito doente.
Se você tem de sofrer uma doença, vai tê-la, senão não a
terá. Eu não pego sua doença nem você vai morrer dessa.