Page 44 - A História de Cada Um | Candeia.com
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— Você é uma moça bonita! Merece mesmo alguém melhor!
— Conseguirá outro emprego!
Ela se sentou, e um homem se levantou.
— Estou muito aflito! Sim, aflito, com medo, mas também
com esperança. Vou contar o que me aconteceu. Morava aqui,
por esta região. Irei parar numa cidade a que, calculo, che-
garemos às doze horas. Estava casado e tenho um casal de
filhos. Estava sempre reclamando, ora da vida, do trabalho,
da esposa e dos filhos. Numa época difícil, sem serviço, vim
para o Sul com muitas pessoas, com trabalho arranjado, no
campo. Viemos num grupo grande de homens. A viagem foi
longa e cansativa. Viemos de caminhão, “pau de arara”, como
era chamado. Chegamos, fomos para uma fazenda e ficamos
num alojamento precário. Entendemos que não seria fácil
42 nossa estadia. Trabalhávamos muito e tínhamos que pagar
pela alimentação, que era boa: café da manhã com leite, café,
pães, bolos, bolachas, almoço e jantar, com alimentos bons e
sortidos, mas pagávamos por isso. Sobrava pouco dinheiro,
e este era mandado para a família por meio do banco. Está-
vamos ali havia três meses e doze dias, quando, numa briga,
um do grupo matou um empregado que nos vigiava. Disper-
samo-nos, nos espalhamos, saímos do local e roubamos o que
conseguimos. Fui com dois companheiros para a periferia da
cidade e ficamos escondidos numa pensão. O proprietário
da fazenda, com medo do escândalo e porque com certeza
seria multado pelo trabalho escravo, escondeu o fato. Soube
depois que ele enterrou o empregado morto na proprieda-
de. Esse homem também não tinha família por ali. Do grupo,
muitos foram embora de ônibus, alguns de carro roubado.
Ficamos nós três na pensão, resolvemos procurar emprego.