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grande dor moral meus amigos sendo vendidos e partindo,
           sem coragem de se despedirem. Chegou a minha vez.
              Era forte, tinha dois metros e três centímetros, ombros
           largos, traços mais delicados. Tinha a cor mulata, mar-
           rom-escuro e com uma grande pinta preta na testa, de uns
           dois centímetros de diâmetro. Lances foram dados e fui
           vendido bem caro. Não fiquei junto de nenhum compa-
           nheiro da fazenda. Senti-me mais sozinho ainda.
              Segui meu novo capataz, amarrado por correntes nos
           pulsos, tornozelos e no pescoço. Era horrível, as correntes
           me machucavam, dificultando até a respiração.
              O capataz não era de muita prosa, mas respondeu às
           perguntas que fizemos, meus companheiros, quatorze ne-
           gros, e eu. Todos adquiridos na feira.
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             — Para onde vamos?                                                  —
             — Para a fazenda Capão Alegre. Vamos construí-la.                   29
             — Não tem nada lá?
             — Só mato, mas com vocês trabalhando, logo estará
           construída e bonita.
              Nós fomos no começo por uma estrada, depois pelo
           campo. Havia lugares em que era preciso abrir caminho
           para as carroças passarem. Ia um capataz a cavalo e ou-
           tros dois guiando as carroças onde estávamos com alguns
           materiais de trabalho e mantimentos. Chegamos após
           um dia inteiro de viagem. Fomos conversando. Embora
           triste, conversei e contei a eles minha história. Todos ti-
           nham histórias tristes para contar. Ali estávamos todos
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