Page 23 - Amai os Inimigos | Candeia.com
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— Noel! Noel!
              Ele ouviu chamarem-no, largou a enxada, caminhou para
           a margem e viu Severino, um pescador que morava na vila.
             — Noel, vim avisá-lo que o envelope pardo chegou e tam-
           bém ver se você me arruma erva-cidreira. Rosa, minha mulher,
           quer fazer um chá. Será que você não me dá uns tomates?
             — Você precisa plantar, Severino! É tão fácil e prazeroso
           cuidar de uma horta! Vou pegar o que me pede e obrigado
           pelo aviso.
              O envelope era carta de Dárcio, certamente ele mandara o
           que lhe pedira. Severino pegou a erva e os tomates, agradeceu
           e foi embora. Noel ficou pensando:
             “Não tenho por que adiar mais. Vou buscar hoje o envelo-
           pe. Tenho dó de deixar tudo, ou melhor, receio. É isso, tenho
           medo. Aqui está muito cômodo. Será que é covardia ou co-             21
           modismo fugir dos problemas?”
              Ali ele tinha paz e tentava resolver problemas alheios, ele
           não os tinha, não naquela ilha. Por não vê-los, sentia não ter.
             “Vou acabar de carpir este pedaço e irei à vila.”
              Meia hora depois, pegou sua canoa e remou devagar, ca-
           denciado rumo à outra margem. A vila não era longe, ele gas-
           tava, para chegar lá, uns trinta minutos quando remava mais
           depressa, mas Noel gostava de ir devagar apreciando as águas,
           os peixes e as margens. Para ir ao povoado tinha que remar
           contra a correnteza, mas o rio não tinha pressa, suas águas
           vinham vagarosamente. Na volta, muitas vezes Noel deitava
           na canoa e ficava olhando para cima, vendo as aves, as nuvens,
           e a canoa vinha devagar como o rio.
             — Como é bom não ter pressa! – exclamava sempre.
              Gostava de sua canoa, comprada quando chegara ali, e já
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