Page 27 - Chico Xavier: o Voo da Garça | Candeia.com
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descendo na direção da estrada de ferro, o ribeirão contorna-
va uma grande várzea, onde crescia capim-provisório, moitas
de capim-gordura, uns poucos juncos, dois ingazeiros e lírios
de cálices muito brancos e perfumados. E foi aí que nasceu
a lenda que há muitos anos me foi contada por um velho do
caminho de Vera Cruz, depois por Sá Tomásia e, em seguida,
por Donana Preta. A lenda era a mesma, mas Sá Tomásia tinha
mais talento para contar uma história, por isso lembro-me
com mais nitidez de suas palavras. No fim do mês de março de
1910, começaram a aparecer garças naquela várzea, as quais
foram-se misturando com os lírios. Palavras de Sá Tomásia:
“E da ponte a gente via um branco que se movia e mudava de
lugar, e um branco que não se movia nem mudava de lugar…”
No dia 2 de abril de 1910, o branco dos lírios e das garças co-
briu toda a várzea. E foi na manhã desse dia, bem cedo, que as
garças embranqueceram vários trechos do azul do nosso céu,
voando aos bandos, sem a menor pressa, num ritual de graça
e leveza, com as penas refletindo a luz do sol e espalhando o
suave perfume dos lírios da Fazenda Modelo pelo povoado de
Pedro Leopoldo. Sá Tomásia: “Foi a manhã mais bonita que vi
em toda a minha vida!… E eu já vi as manhãs de mais de trinta
mil dias…” À tarde, as garças voltaram a voar sobre o povoado,
levando em suas penas o perfume dos lírios. E só retornaram
ao ponto de onde saíram quando o sol começou a se esconder
no horizonte. Sá Tomásia: “Quem abriu a janela naquela noi-
te viu o céu como se ele estivesse atrás de um vidro de cristal,
com as estrelas mais próximas da Terra e brilhando mais que
em outras noites, e sentiu no vento um suave perfume de lírio…”
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